Minha primeira experiência em atendimento psicológico ainda como estagiária na graduação foi com um cliente idoso.
A vivência ficou registrada porque coincidentemente acorreu no dia 29 de agosto, dia do Psicólogo.
A literatura tem demonstrado que a procura por psicoterapia para idosos tem aumentado nos últimos anos. Este aumento se explica pelo ganho na expectativa de vida, estamos vivendo mais, os idosos com mais de 60 anos ou mais quase duplicaram entre os anos de 2000 e 2023.
As mulheres buscam mais a psicoterapia que os homens, e as queixas são de tristeza e pessimismo. Porém mesmo com a ampliação do cuidado da saúde mental na terceira idade o que as pesquisas também revelam é que ainda persiste o preconceito e o desconhecimento sobre o que é psicoterapia, para que serve e os benefícios que a terapia para idosos pode produzir na qualidade de vida e na saúde.
A desconfiança em relação a psicoterapia pode ter vários fatores, mas um em especifico é fruto do imaginário social que em pleno século XXI, na era da informação, ainda se mantem a fantasia de que ir ao psicólogo ou psiquiatra é atestado de loucura, ou de fraqueza, ou falta de fé em Deus.
A ideia da separação entre mente e corpo corroboram para sustentar essa falsa impressão. O adoecimento no corpo físico é aceito e tratado, mas quando o sofrimento ou a dor acontece na mente se tem a errônea percepção de que esta não faz parte do corpo, e sim alguma coisa separada, não palpável, invisível, por isso de menor importância. Mas, fato é que corpo e mente são apenas um só corpo, e estão interligados, conectados, e o adoecer de um influencia e impacta o outro.
Por isso se a saúde mental não for cuidada da mesma forma que a corporal corre o risco de o sofrimento chegar num ponto tão insuportável que acaba culminando com a ruptura com a realidade, o que chamamos de loucura.
Gosto de dizer que ir aos serviços de psicologia e ou psiquiatria não significa que se está louco, mas ao contrário deve-se ir a esses profissionais para evitar, para prevenir o sofrimento mental.
Outro fator que contribui para a rejeição ao processo psicoterapêutico é as características do nosso modo de nos organizarmos como sociedade na contemporaneidade. Cultuamos a imagem perfeita, a resposta imediata, a busca por satisfação plena, o perfeccionismo, a produtividade e alta funcionalidade. Assim fica difícil aceitar nossas fragilidades e muito menos falar sobre elas com um psicoterapeuta é mais fácil se render ao uso dos psicotrópicos: os antidepressivos, ansiolíticos, e remédios para insônias.
As pesquisas demonstram um abuso dessas substâncias químicas principalmente na idade adulta avançada.
O termo psicoterapia é derivado da união de duas palavras do grego: psique, que significa “espírito, alma, alento”; e therapeia, que significa “cura, tratamento”. De uma forma geral podemos entender que psicoterapia é tratamento ou cura da alma, e com um olhar mais específico, vamos descobrir que cura que tem sua origem no latim significa: cuidado, atenção, vigilância.
Cabe ao médico cuidar do corpo físico, visível, mensurável, enquanto ao psicoterapeuta o cuidado daquilo que não se vê e nem se mensura: o desespero, a dor, o sofrimento.
Assim a psicoterapia é um espaço de cuidado das emoções, sentimentos, pensamentos, das relações, da existência em qualquer ciclo da vida.
Faz-se necessário ressaltar que a psicoterapia se sustenta em métodos e técnicas a partir de uma visão biopsicossocial e sexual do homem baseada em eficiência e eficácia científica e orientada por um código de ética profissional.
Várias são as classificações usadas para indicar a fase da velhice: idosa, melhor idade, terceira idade, senescência e senilidade.
Na visão da Psicologia, o envelhecimento é um ciclo da vida como todos os outros, porém impactado por muitas mudanças importantes como: aposentadoria, a partida dos filhos, a perda de pessoas queridas, as limitações físicas em decorrência de doenças crônicas. Todas estas vão provocar alterações fisiológicas, psicológicas e sociais.
É importante levar em consideração que os resultados das experiências vivenciadas durante a vida podem propiciar uma velhice mais favorável ou desfavorável.
A senescência é a velhice como processo natural e que apresenta alterações como: perda da cor do cabelo e queda, aparecimento das rugas, perda da flexibilidade, já a senilidade que é um complemento da senescência, mas com doenças crônicas como: hipertensão, diabetes, insuficiência renal e cardíaca e outras, que foram adquiridas durante a vida e estas vão impactar e comprometer a funcionalidade e qualidade de vida, principalmente na velhice, mas elas não são alterações normais do envelhecimento.
O processo psicoterapêutico tem como objetivo a compreensão e construção de novos sentidos para os aspectos comuns nesse ciclo da vida.
A Dra. Becca Levy é uma psicóloga pesquisadora dos fatores que influenciam a função cognitiva e física e a longevidade dos idosos. Em seu livro “A Coragem de Envelhecer” ela aborda o etarismo, preconceito por causa da idade, suas causas e impactos na qualidade de vida e saúde mental na terceira idade.
Uma informação importante é que não existe um identificador biológico específico para classificar alguém como idoso, portanto, a velhice é fruto de uma construção social, por isso as visões de idade e as possibilidades relacionadas a elas são potentes, elas vão determinar como seremos.
Para Dra. Becca, a partir de suas inúmeras pesquisas, a visão e o que pensamos sobre a velhice pode contribuir fortemente como será nosso futuro, quanto mais negativa for essas imagens mentais e pensamentos maiores as probabilidades que o envelhecer seja muito triste e sofrido.
Por outro lado, quanto mais positiva, maior será a possibilidade de envelhecer com saúde. Se resistirmos com coragem ao etarismo e toda visão negativa e aos estereótipos a vida na velhice pode ser de fato a melhor idade.
E é aí que a psicoterapia tem muito a contribuir para a construção de um projeto para envelhecer com coragem, com bons hábitos e atitudes, mas principalmente com a mente saudável e esperançosa.
Como já dissemos a terceira idade vem com muitas mudanças significativas e elas “podem” (as aspas é para indicar uma possibilidade e não uma determinação) impactar a saúde mental favorecendo episódios de depressão, ansiedade e outros transtornos.
Existem pesquisas que mostram os efeitos terapêuticos da terapia para idosos, que são diminuição dos sintomas depressivos, aumento da autonomia, maior regulação emocional, fortalecimentos das estratégias de enfrentamento.
A literatura demonstra que a Psicoterapia é um instrumento significativo, e talvez o caminho mais eficaz para tratar as questões psicológicas e mentais.
Todas as psicoterapias promovem em algum nível mobilização afetiva, capacidade de expressão dos afetos, redução de resistências, desfazendo defesas, construindo possibilidades de mudanças.
CFP (Conselho Federal de Psicologia). Conselhos Regionais de Psicologia.
Grupo de Trabalho da APAF sobre Psicoterapia. Reflexões e orientações sobre a prática da Psicoterapia. Brasília. 2022. Disponível em: www.cfp.org.br
Gomes, E. A. P., Vasconcelos, F. G., & Carvalho, J. F. (2021). Psicoterapia com idosos: Percepção de profissionais de psicologia em um ambulatório do SUS. Psicologia: Ciência e Profissão, 41, 1-17. https://doi.org/10.1590/1982-3703003224368
Levy, B. (2022). A coragem de envelhecer: A ciência de viver mais e melhor. Cláudio Carina (trad.). Editora, Principium.